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quinta-feira, 29 de agosto de 2013

V de Vingança


SPOILER FREE

E no mês dedicado à vingança no Desafio Literário não podia faltar pelo menos um clássico nesse assunto tão humano. "V de Vingança" é um clássico dos quadrinhos que eu tentei ler há alguns anos e não consegui (inclusive é por isso que está no Desafio, se eu não terminei de ler não conta como releitura!) por achar chato demais. Quase 10 anos depois resolvi "me vingar" e dessa vez ir até o fim!

É interessante observar como a leitura pode ser uma experiência tão diferente ao longo da vida. Depois da primeira tentativa frustrada, confesso que não levava muita fé que conseguiria ler até o final. Tudo bem que dessa vez não achei tão chato quanto na primeira tentativa, mas acho que a experiência com alguns livros bem intragáveis ao longo desse tempo também ajudou (só pra alfinetar).

"V de Vingança" é uma obra muito interessante, e num momento onde tantas manifestações e rebeliões têm acontecido pelo nosso país e pelo mundo, sua leitura se torna mais relevante. Mas apesar de ter algumas tiradas geniais e questionamentos políticos muito relevantes, a defesa da Anarquia proposta na obra é muito pueril na minha humilde opinião.

Outra coisa que me incomodou na obra é como as mulheres são retratadas. Colocando no contexto de ser uma obra para um mercado quase exclusivamente masculino, escrita nos anos 80 (final dos 70, início dos 80 se quisermos ser ainda mais precisos), é compreensível a forma como as mulheres são mostradas: sempre vítimas, na maior parte do tempo despreparadas, nunca em cargos minimamente importantes e sempre lindas e com pouca roupa. Aliás, o que não falta é desculpa para mostrá-las com pouca (ou nenhuma) roupa. E tanto é assim que a personagem de maior peso político na história é uma femme fatale clássica, que usa dos seus atributos físicos para conseguir o que quer. Até mesmo a personagem feminina mais importante e cuja participação no final é de extrema importância é mostrada na maior parte do tempo como uma vítima infantilizada. E quando ela finalmente sai dessa condição ela é imediatamente mostrada de forma mais masculina. Entendo o contexto, mas não curti nem um pouco (esperava mais do Alan Moore).

Problemas à parte, a leitura é tranquila e a arte já virou cult, então não tem muito o que comentar quanto a parte visual. O texto é cheio de citações interessantes e é montado de uma forma bem peculiar (não tem balões de pensamento!). Mas não é a melhor Graphic Novel que já li. Infelizmente ela fica bem mais pro final da fila (que tem aumentado muito desde o ano passado).

Nota 7 porque eu não sou vingativa.

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Shalimar, o equilibrista


SPOILER FREE

Depois de ler mais uma história horripilante sobre a pobreza extrema (que gera medidas extremas) no interior do Egito, resolvi continuar pelo Oriente Médio e ler o fabuloso escritor Salman Rushdie. E se eu tinha achado que "God dies by the Nile" não era vingativo o suficiente, Shalimar o Equilibrista supriu a cota necessária de vingança, com direito a tramas de longo prazo para se chegar a ela, justificando plenamente o ditado do prato frio e se encaixando perfeitamente no tema do Desafio Literário desse mês.

Bem ao estilo do seu autor, que é um cidadão do mundo, a história se passa em diversos países, desde a Europa da Segunda Guerra Mundial, passando pela luta entre Paquistão e Índia pela Caxemira e chegando até aos Estados Unidos nos anos 80, 90. E para ilustrar bem o caminho que levou Shalimar e India a se cruzarem, o autor desfia a história de 3 gerações de suas respectivas famílias, onde todos os personagens são absolutamente fascinantes, desde a espiã que conseguiu fugir diversas vezes dos nazistas até o chefe de uma aldeia perdida no alto das montanhas da Caxemira.

Os personagens são tão bem montados e tão realistas que em diversos momentos eu perdi completamente a noção do que poderia ser ficção ou realidade nos fatos históricos narrados pelo autor. E se alguém me perguntar sobre a guerra pela Caxemira confesso que só saberei falar sobre o que li nesse livro, com direito a todos os seus personagens fictícios.

E no meio de toda essas guerras e lutas por poder que atravessam os mares e os séculos, o amor surge apenas para causar mais conflitos (claro), incidentes internacionais (para temperar) e a ilusão de que um dia as coisas podem melhorar, quando na verdade as grandes traições nunca serão perdoadas, e serão motivadoras de vinganças horríveis.

Dito isso tudo, posso completar dizendo que o livro é absolutamente eletrizante, e quando ele não é deliciosamente romântico é cruelmente macabro (e realista, o que pode ser pior se você parar para pensar muito). A leitura é dinâmica e as viagens pelo tempo, através da narrativa sobre cada personagem, tão estimulante que você nem liga quando uma história é interrompida para ser retomada apenas mais à frente.

Mas o final... pois é, ainda não decidi se gostei ou odiei o final do livro. Ele é genial, e ao mesmo tempo horrível para o leitor que não gosta de ambiguidades, e estou me sentindo muito dividida com relação a isso. O que de certa forma é bom, pois não consigo tirar o livro, o final e toda a sua história da cabeça, mesmo depois de ter lido e já ter começado outro livro.

Nota 10, apesar do final, para você ver como é boa literatura.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

God dies by the Nile


SPOILER FREE

E depois de ficar um bom tempo sem escrever por aqui por conta de uma viagem, e claro, por conta da volta da viagem (as coisas acumulam que é uma loucura), voltei com estilo! No mês dedicado à vingança no Desafio Literário, resolvi passear pelo conturbado Egito com a egípcia Nawal El Saadawi.

Escolhi esse livro por 2 motivos, o primeiro é que eu gostei demais de outro livro da autora ("Woman at point zero"), o segundo é porque na contracapa dizia que o livro era sobre a vida de uma mulher camponesa cujas sobrinhas sofrem nas mãos do prefeito da sua cidade e ela resolve se vingar. Perfeito, né?

Apesar dessa história não ser tão contundente na questão feminina, Nawal El Saadawi abrange o leque de problemas sociais retratados nesse livro, pois ao invés de se ater aos problemas das mulheres egípcias, ela aborda também os problemas do interior do Egito, onde os camponeses sofrem nas mãos dos seus governantes (bondade chamar assim, capataz é bem mais adequado) e também das suas crenças despropositadas (a velha história de que apesar de não estar no Corão as pessoas ainda pensam de determinada maneira como se estivesse - é claro que esse tipo de coisa é válida para qualquer sistema religioso, mas enfim). Tudo isso de forma bem explícita e com histórias de arrepiar.

A única coisa que me deixou chateada é que, apesar de ter a tal mega vingança mencionada na contracapa, o livro não trata exclusivamente do assunto, e eu confesso que esperava uma construção mais elaborada para o ato final. Tudo bem que eu esperar algo super elaborado ou montado com maquiavelismo por uma camponesa egípcia de origem absurdamente humilde era algo pouco lógico, mas fazer o que, né?

Apesar disso, a autora egípcia está cada vez mais ganhando o meu respeito, seus livros são marcantes e deixam traços indeléveis nos seus leitores. Ela mostra a verdade de forma tão nua e crua que é impossível ficar insensível. Por conta disso mesmo também não recomendo a leitura em série dos seus livros, pessoalmente, acho que eu ficaria deprimida se fizesse isso.

Nota 10.